Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica - Regional São Paulo

A implicação legal da utilização de próteses ou implantes pelo médico cirurgião plástico

Nos últimos dias temos verificado notícias na mídia escrita e falada referente à implantação/utilização de implantes mamários de silicone e as suas conseqüências no organismo humano, seja pela falta de qualidade técnica, seja pelo material utilizado para sua confecção. Lembramos neste momento, que a solução discutida neste artigo, aplica-se a quaisquer tipos de próteses ou implantes, não apenas aos mamários.
No último dia 09/03/pp. a Agência Nacional de Saúde – ANVISA, como órgão oficial regulamentador do setor, proibiu a venda dos implantes mamários de silicone das marcas Poly Implants Protheses – PIP e ROFIL Medical Nederland B.V, conforme a resolução que ora transcrevemos:

“RESOLUÇÃO – RE Nº 1.016, DE 8 DE MAIO DE 2012 O Diretor da Diretoria Colegiada da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, no uso das atribuições que lhe conferem o Decreto de nomeação de 31 de março de 2011, da Presidenta da República, publicado no DOU de 1º de abril de 2011, o inciso VIII do art. 15, o inciso I e o § 1º do art. 55 do Regimento Interno aprovado nos termos do Anexo I da Portaria n.º 354 da ANVISA, de 11 de agosto de 2006, republicada no DOU de 21 de agosto de 2006,Portaria nº 1417, de 20 de setembro de 2011; considerando o art. 7º, da Lei nº 6.360, de 23 de setembro de1976; considerando a suspeita de desvio na composição do produto, o qual é fabricado pela empresa Poly Implants Protheses – PIP (França); considerando, ainda, que a Empresa Rofil Medical Nederland B.V. teria terceirizado a fabricação de próteses à Empresa Poly Implants Protheses, resolve: Art. 1º Determinar, como medida de interesse sanitário, a suspensão, em todo o território nacional, da importação, distribuição, comercialização e implantes de PRÓTESES MAMÁRIAS DE SILICONE das marcas PIP e ROFIL, independentemente de quem quer que seja a importadora.Art. 2º Determinar, ainda, que as empresas que possuam – ou que possuíram – registro das referidas próteses, promovam o recolhimento do remanescente dos produtos eventualmente existentes no mercado brasileiro. § 1º No prazo de 30 (trinta) dias, as empresas de que tratam este artigo deverão encaminhar à ANVISA relatório final de recolhimento do produto, contemplando o quantitativo importado, comercializado/ distribuído e recolhido; os comprovantes de informação enviados para as empresas destinatárias, bem como as respectivas respostas recebidas. § 2º Ficam as empresas importadoras responsáveis pela guarda de todas as unidades recolhidas do produto para inspeção e coleta de amostra pela Autoridade Sanitária competente. Art. 3º Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação”.

Quanto aos motivos expostos na resolução supra, não nos cabe o ingresso no mérito, até porque passível de recurso e das medidas judiciais cabíveis.

Interessante ao médico, no entanto, as questões ligadas a sua atuação profissional frente a eventual problema originado em prótese por ele implantada em paciente. Teria o cirurgião plástico alguma responsabilidade, pelos danos originados ao paciente?

Tais questionamentos devem ser enfrentados de forma cuidadosa.

Evidente que o profissional da medicina jamais, na prática de seu mister , irá realizar uma cirurgia para colocação de implante sabendo que o produto que está sendo utilizado não é de boa qualidade ou desrespeita as normas de saúde impostas pelos órgãos competentes, sob pena de sofrer as conseqüências jurídicas de seus atos, seja na esfera cível (ação de indenização), penal (ação penal) e administrativa (sanções junto ao CRM), posto seu dever de cuidado objetivo. A boa aplicação da ciência da medicina indica que o médico não deve expor seu paciente a tratamentos experimentais, ou a medicamentos não autorizados ou proibidos pelos órgãos de saúde pública, procedimentos que atribuiriam ao médico responsabilidade por danos causados a seus pacientes.

Neste ponto, o médico que atua dentro dos padrões da medicina, utilizando-se de próteses, implantes ou medicamentos para a consecução de sua atividade de acordo com as determinações legais, nenhuma sanção poderá lhe ser imposta, face a obediência de todas as normas técnicas e legais, noutras palavras, caso tenha se utilizado de uma prótese, que no momento da cirurgia encontrava-se aprovada pela ANVISA, não poderá, no futuro ser responsabilizado pelo produto implantado, ainda que este venha a causar problemas no paciente. Mas que fique claro: problema originado no produto implantado e previamente autorizado pelos órgãos de saúde pública, diferente situação se verificará se o problema estiver não na prótese em si, mas nos procedimentos médicos de implantação (tais como erro médico ou de equipe cirúrgica).

Resta claro que o médico não pode ser responsabilizado por “defeito” do produto que no futuro venha a causar problemas de saúde no paciente, por dois motivos: 1-) realizou a implantação de determinada prótese ou implante nos termos da boa medicina; 2-) no momento de sua implantação estava de acordo com as regras da ANVISA.

De outro lado, podemos verificar algumas situações graves e que podem acabar atingindo de forma direta e indireta o médico cirurgião plástico, quando este utiliza um implante que sabe não respeitar as regras técnicas ou não este está autorizado pela autoridade sanitária competente, assumindo o risco (atraindo para si) a produção do resultado danoso.

O médico em seu campo profissional técnico e complexo, deve procurar apenas e tão somente ficar vinculado ao paciente nos limites da prática da medicina, mas isso nem sempre é possível.

Vejamos algumas situações que são constantemente objeto de consulta jurídica por parte dos médicos cirurgiões plásticos:

Oriento o paciente na escolha dos implantes mamários apenas em consulta, mas não descrevo tal fato no termo de consentimento informado. – Prática bastante comum entre os médicos, que temem comprometer-se com uma escolha específica. O problema é que, como dito em artigos anteriores, se o médico tiver pela frente um paciente desonesto, pode sofrer acusação de ter vendido uma prótese e isto sim trazer-lhe problemas.

Apresento ao paciente os Bons Implantes do “mercado” e deixo a escolha desta a sua preferência, mas não descrevo tal fato no termo de consentimento informado. – Como evitar que o paciente, por sua dependência natural dos procedimentos médicos, não peça a indicação do implante mamário que o médico considere a melhor? O médico sente-se melhor em não comprometer-se com um implante específico, deixando esta escolha para o paciente. Os mesmos problemas apontados no item 1 podem acontecer, sem falar na possibilidade do paciente acabar fazendo a “pior” escolha, muitas vezes motivado por preço e não qualidade.

Oriento o paciente na escolha do implante mamário e descrevo o procedimento no termo de consentimento informado.- Neste caso o médico assume a postura de auxiliar o paciente na escolha do implante mamário e deixa isto claro no termo de consentimento informado. Esta hipótese afasta a possibilidade de ser vítima de um paciente desonesto e restringe o universo de possibilidade de escolha dos implantes o que auxilia o paciente.

Não deixo opção de escolha ao paciente, pois somente trabalho com um implante mamário de minha confiança e deixo isto claro no termo de consentimento informado. O médico escolhe sozinho os implantes a serem utilizados, até porque, sendo ele o responsável pelo resultado final e saúde de seu paciente, não quer assumir riscos com a qualidade que considera inadequada ao seu trabalho final.

Os senhores médicos começam a perceber que, em nenhuma das hipóteses acima, o médico será responsabilizado pela qualidade do produto implantado, mas quando não descreve o procedimento, qualquer que seja ele, no termo de consentimento informado, pode ficar sujeito a um paciente desonesto.

Já no que tange a utilização de implantes mamários que não respeitam as regras da ANVISA (estando o médico ciente) e àqueles que foram proibidas sua comercialização, o médico sempre deve abster-se de realizar cirurgia plástica nestas condições, face o risco real de conseqüências na saúde do paciente e a responsabilidade do médico por este ato.

Resta consignar que em nenhum momento é razoável ao médico cirurgião plástico, a venda direta ou indireta de determinado produto (implantes mamários, nesta explanação) ao paciente, sob pena de assumir riscos desnecessários no que tange a determinado produto que venha eventualmente causar danos na saúde do paciente.

Sua atuação está ligada ao exercício da medicina e não a comercialização de produtos cirúrgicos, o que, na espécie, pode haver uma postura promíscua entre a atividade final da medicina e a comercialização de produtos, infringindo inclusive, o código de Ética Médica:

Art. 69. Exercer simultaneamente a Medicina e a Farmácia ou obter vantagem pelo encaminhamento de procedimentos, pela comercialização de medicamentos, órteses, próteses ou implantes de qualquer natureza, cuja compra decorra de influência direta em virtude de sua atividade profissional.

Por fim, seja qual for a postura adotada pelo médico cirurgião caso haja indicação, recomendação ou imposição de determinado implante mamário, deverá sempre cientificar o paciente de forma explícita, ou seja, no seu termo de consentimento informado. Por outro lado, o médico deve sempre abster-se de realizar qualquer tipo de venda de determinado produto ao paciente, seja de forma direta ou indireta, evitando, assim, problemas na esfera judicial com o próprio produto que vendeu e até mesmo o argumento de venda casada (aquela que vincula a cirurgia com a compra do material oferecido pelo médico).

Claudio Roberto Faustino – Advogado – Assessor Jurídico da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica – Regional São Paulo – Advogado – Mestre pela PUC/SP – Professor da Universidade Camilo Castelo Branco – Unicastelo
Daniel Kakionis Viana – Advogado – Assessor Jurídico da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica – Regional São Paulo – Advogado – Mestre pela UNIB – Professor da Universidade Camilo Castelo Branco – Unicastelo